bocadomangue Mario Moscatelli

A verdade ou só parte dela?

Pensem por apenas alguns poucos minutos no que vou tentar repassar-lhes, inquietações que vêm me atormentando desde a morte de meus pais com implicações muitas das vezes sufocantes. Esqueçam, ou ao menos tentem esquecer todas as mitologias que de uma forma ou de outra nos são repassadas voluntariamente ou não ao longo de nossas vidas. Pensem na possibilidade que a realidade na qual estamos inseridos seja a única que nos é oferecida por um processo físico e evolutivo no qual como peças de montar, nossos DNAs vem se recombinando das mais diferentes formas, com o único objetivo de se perpetuar, única e simplesmente, às mais diferentes condições ambientais. Estas últimas funcionando como filtros naturais àqueles DNAs mais adequados ou capacitados para sobreviver naquelas momentâneas condições espaço-temporais-ambientais. Aceitem por alguns segundos que tudo que nos repassaram de possíveis vidas além morte nada mais são que um alento e um freio ao possível desespero e caos que assolariam uma espécie que por ter desenvolvido a capacidade de prever que há o dia de amanhã, não aceita desde então sua finitude e mortalidade dentro de um universo inimaginavelmente gigantesco e sufocante.

Repassando nosso raciocínio para a nossa rotina diária globalizada, recheada por balas perdidas, atos terroristas e guerras anunciadas, me espanto em constatar como desdenhamos de nossa provável única existência, como menosprezamos a vida de nossa espécie, talvez a única até o momento, comprovada por nossa maravilhosa e aterradora capacidade de prever.

Incomodo-me como nos matamos seja em nome de algum deus, seja em nome de alguma bandeira, de dinheiro e principalmente por nossos interesses pessoais e corporativistas. Algum tipo de existência após o fim de nosso corpo material é uma idéia que norteia boa parcela das religiões ou o que o valha. Funciona como um alento, como uma bóia para afogados, afogados num oceano frio de energia organizada em matéria. Talvez o suicídio como pecado derive justamente do conhecimento de alguns há muito tempo, da importância do "milagre" de nossa existência, energia organizada em matéria em busca do porque, do autoconhecimento.

No entanto diante de tamanha confusão na qual me chafurdo não posso negar a existência de algo, principalmente num período meio brabo no qual quase que acabei descobrindo a tal resposta da qual derivam essas linhas. Sim, algo quase que imperceptível, mas presente nas tais chamadas coincidências. Não posso negar que existia algo mais indefinível, mas definitivamente fundamental, aquilo que faz a diferença, e que para seu escritor noturno significou poder estar aqui agora escrevendo.


Quando tive de executar a mais do que árdua tarefa de exumar os corpos de meus pais, por mais que eu soubesse o que iria encontrar, até hoje não consigo encaixar as imagens do antes e do depois. Meus pais simplesmente sumiram e no lugar deles apenas encontrei ossos. Naquele momento tive a certeza de estar vendo a Verdade. Só que até hoje não sei se aquela Verdade era total, absoluta e aterradora ou apenas uma parte dela, uma prova que eu continuo sendo testado e reprovado por tanto sofrimento que tenho sentido desde então.

De qualquer forma, seria importante que déssemos como espécie momentaneamente dominante dessa pequena pedra, um oásis que flutua no espaço, maior valor a essa dádiva ou produto evolutivo chamado vida, em todas as sua formas de apresentação.

A única certeza que tenho é que temos muito a aprender quanto a importância da parte desse sonho que a maioria chama de realidade.

Esse artigo talvez eu nunca apresente em público mas com certeza me ajudou junto com a mitologia de Guerra nas Estrelas, aliviar essa madrugada sufocante.

MARIO MOSCATELLI - Biólogo - moscatelli@biologo.com.br

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