oceano .Planeta Oceano Agenor Cunha da Silva

Rodrigo de Freitas
PRESERVAÇÃO AMBIENTAL DE UM CARTÃO POSTAL

Os problemas ambientais que se apresentam nos grandes centros urbanos muita das vezes não surgem apenas em decorrência das altas densidades populacionais. A ocupação irregular com a construção de grandes prédios, como por exemplo ocorre ao longo do entorno da Lagoa Rodrigo de Freitas, certamente constitui uma forma não recomendável de ocupação. O cenário atual talvez não seja muito diferente do passado. Os contingentes populacionais em seus movimentos migratórios, sempre procuram convergir, ao longo do tempo, para locais que lhes oferecem melhores oportunidades e qualidade de vida.

A falta de planejamento, via-de-regra, aparece como fator adicional que contribui para a degradação ambiental. Ocupações indevidas degradam ainda mais estes ambientes. Assim, os problemas ambientais colocados à luz das ocupações antrópicas podem contribuir, mas não são a única causa dos problemas que surgem.

No caso dos problemas ambientais da Lagoa Rodrigo de Freitas verifica-se que eles não aparecem exclusivamente devido ao fator antrópico. A forma de poluição que atormenta a população que vive no seu entorno, apresenta aspectos particulares, que verificamos não serem exclusivos ou conseqüente do crescimento urbano.

Considerada como um corpo d'água costeiro ela guarda uma situação crônica que ao longo da história aponta para a existência de problemas ambientais que extrapolam a simples degradação da qualidade das suas águas. Remontando a 1877, relatos do Barão de Lavradio bem como de Teffé em 1880, apresentam situações onde se constata que as condições ambientais não são muito diferentes das atuais.

Tais relatos mostram claramente que os problemas de circulação associados à mortandade dos peixes, como os que hoje sentimos, já eram problemas comuns naquela época. Estes relatos são de grande importância, tendo em vista que extrapolam todas os argumentos de que os problemas atuais estão diretamente relacionados aos processos de ocupação indevida do seu entorno.

A proposição dos inúmeros projetos voltados para este problema, nos últimos anos não parece surtir os efeitos desejados, tendo em vista ações paliativas mais ligadas aos aspectos paisagísticos do que àqueles que realmente relevantes para contornar os problemas de degradação.

Dentre os inúmeros problemas que surgiram ao longo dos tempos, deparamos com um realmente inusitado, e que acabou por se constituir na mola mestra da necessidade de se intervir naquele ambiente. Trata-se do odor extremamente desagradável que em algumas ocasiões exala da lagoa, afastando seus admiradores e incomodando os moradores mais próximos. Sabidamente, decorre da intensa mortandade dos peixes que sucumbem por falta de oxigenação das suas águas. Quando os processos circulatórios são afetados pelas forças eólicas, as correntes passam a atuar de forma negativa provocando fluxos que revolvem seu fundo provocando esta situação.

Buscar soluções para problemas ambientais apenas ressaltando argumentos jurídicos, não me parece ser o suficiente para que possamos encontrar as soluções que desejamos. Como Geomorfólogo, tenho dúvidas da eficácia que certas ações possam representar, quando adotadas de forma isolada. Ao citar leis protecionistas (Lei Nº 9.433/97) que relacionam aspectos isolados, alguns projetos deixam diversas lacunas que poderiam ser de grande valor para evitar a degradação ambiental. Verifica-se que muitas vezes as implicações advindas destas intervenções, mesmo respaldadas em leis, acabam por provocar resultados inesperados. É necessário se ter a percepção de que certas ações, quando colocadas em prática, sem os devidos respaldos de estudos concisos e consistentes, podem representar sérias ameaças, ao ser humano e, aos próprios ambientes onde são aplicadas.

Ao se tentar contemplar todos os aspectos envolvidos, muitos os ambientalistas involuntariamente acabam por relegar a segundo plano aspectos que por vezes podem interferir na evolução dos processos ambientais. Na realidade, eles sustentam situações críticas que raramente aparecem nos inventários dos naturalistas, mas que podem vir afetar negativamente um ambiente. A necessidade de estudos mais abrangentes dos ambientes costeiros, tais como aqueles que normalmente são levados a cabo em lagos, lagunas, estuários, ou mesmo de pequenas partes do litoral, exigem ações conjuntas de equipes multidisciplinares. Congregam pelo menos a participação de Geólogos, Geógrafos, Biólogos, Engenheiros e Meteorologistas, que em sincronia e com o devido apoio financeiro possam ser capazes de desenvolver um trabalho proveitoso, elaborando projetos, cujos resultados efetivamente resultem em benefício de todos e permitam a recuperação e a conservação de ambientes degradados.

No caso da Lagoa Rodrigo de Freitas, evidencia-se que a degradação da qualidade das suas águas, não constitui o único fator a ser contornado. Restabelecer o padrão de qualidade da água da lagoa é apenas um detalhe. É preciso verificar como os processos conexos podem interferir nas condições hidrológicas para o restabelecimento da qualidade das águas. Certamente outros fatores também necessitam ser conhecidos, tendo em vista que eles interpõem-se imperativamente para manter o equilíbrio dinâmico e restabelecer de forma aceitável os processos ambientais. Em outras palavras, é necessário se conhecer em detalhe as variáveis e os processos associados que permitem manter o equilíbrio geosistêmico daquele corpo d'água.

Ao se tratar destes ambientes, a busca da excelência é também uma condição imperativa. Devemos considerar a procura das melhores tecnologias disponíveis. Todavia, como sabemos, devemos ter em conta, que este processo de busca deve ser bastante cauteloso. Mesmo que viéssemos a descobrir, por exemplo, alguma forma capaz de permitir a imediata despoluição da lagoa, sem que nenhum efeito colateral pudesse aparecer. Ainda assim, devemos ter em mente que isto iria nos consumir pelo menos, na melhor das hipóteses, umas três décadas. Como a história tem demonstrado, a humanidade em sua evolução leva pelo menos cinqüenta anos para substituir suas fontes de energia. Foi assim para passarmos da madeira para o carvão e do carvão para o petróleo. Certamente, ainda levaremos um bom tempo até para nos beneficiarmos de todas as benesses que a fusão nuclear pode nos fornecer, saindo da fase de testes em laboratórios para tornar-se plenamente acessível para todos.

Ao se divulgar as ações a serem levadas a cabo pelas autoridades, como no caso da Lagoa Rodrigo de Freitas, é importante que os responsáveis pelos projetos de recuperação dessa área assumem plenamente suas responsabilidades, no sentido de manter a sociedade informada. Em algumas situações, a utilizar argumentos inconsistentes, geralmente tem sido pratica comum para sensibilizar a opinião pública e inspirar confiança, até mesmo em quem possui algum conhecimento sobre os efeitos negativos que ações infundadas podem provocar aos ambientes. Perfeitamente integrados e com força total, no inicio dos trabalhos todos são motivados para a sua execução. Todavia, ao decorrer da vida útil do projeto acabam perdendo seu norte e são abandonados em seus objetivos sem nenhuma conclusão. Neste sentido, é necessário que haja transparência nas ações governamentais. Sejam elas Federais, Estaduais ou Municipais não devem se recolher nos questionamentos que surgem. Em época de crises, a sociedade civil, representada pelas Universidades e Associações ligadas aos assuntos ambientais, merece ter pleno conhecimento de como os recursos gerados pelos impostos que pagam estão sendo aplicados.

Em conclusão, apesar de não ser intenção deste artigo, como reflexão e talvez como subsídio, expresso a necessidade de que os responsáveis por projetos ambientais sejam capazes de divulgar a evolução das suas ações. Projetos, tais como o que pretende "despoluir" a lagoa, devem passar a adotar uma postura mais democrática. É necessário que se adote uma postura mais aberta, abrindo dialogo que permita tecer sugestões sobre a evolução do projeto; se possível em tempo real, pela Internet. Certamente, esta atitude irá reverter em benefícios para todos. Em minha percepção, imagino que os trabalhos que atualmente estão sendo levados a cabo para se tentar aspirar camadas de sedimentos mais finos do fundo da lagoa, consideram a possibilidade de que possam vir a desestabilizar condições de equilíbrio geosistêmico a que estes tipos de ambientes estão sujeitos. Certamente, estudos sedimentológicos associados aos de estabilidade de encostas poderão ter grande significado no esclarecimento das possibilidades de que acomodações de áreas do entorno da lagoa.

É necessário assegurar que tais ações não venham contribuir para acelerar processos deposicionais críticos, como bruscas acomodações ou afundamentos de setores do entorno, como já ocorreu em pequena escala, em diversos trechos da pista que foi construída na orla deste magnífico cartão postal da nossa cidade maravilhosa.

MSC. Agenor Cunha da Silva - agenor@biologo.com.br
USU/ICBA - RJ

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