COLAPSO
Nessas
três últimas semanas de dezembro de 2005, desde que dei
o primeiro alerta a respeito da invasão das gigogas em nossas
praias, tenho refletido muito num livro que venho lendo, chamado COLAPSO.
Esse importante documento escrito por Jared Diamond, em resumo analisa
os motivos que levaram determinadas sociedades do passado ao desaparecimento
ou à sobrevivência e prosperidade. Entre os diversos aspectos
analisados cuidadosamente pelo escritor, um se destaca, que é
a relação dessas sociedades para com seus recursos naturais.
Também não HÁ DÚVIDAS, que a questão ambiental se tornou claramente uma arma para a criação de obstáculos, onde cada esfera do poder público, atrelada à diferentes bandeiras partidárias, joga o jogo do quanto pior, melhor em ano eleitoral, onde a culpa do “filho feio”, é sempre da outra esfera. NUNCA ouvi ou vi, alguma autoridade pública assumir a responsabilidade de qualquer problema ambiental! É como se as forças da Natureza ou o acaso perseguissem nossos “pobres e desprotegidos” administradores públicos. A cada ação de uma esfera, há imediatamente a criação pela outra de um novo obstáculo. E nisso, para cada parada, para cada embargo, para cada termo de ajuste de conduta, são meses de discussão e a degradação “comendo solta”! É isso que eu presenciava diariamente na Lagoa Rodrigo de Freitas e atualmente presencio no Sistema Lagunar da Baixada de Jacarepaguá. Num sobrevôo de helicóptero sobre a região da baixada, qualquer um fica estarrecido como depois de vitimarmos a maior parte de nossa cidade com a ausência de um conjunto articulado de políticas das três esferas do poder público, que de fato ordenassem o uso do solo metropolitano, os mesmíssimos erros se repetem em “tempo real”, bem diante dos olhos de uma sociedade apalermada, sufocada por um verdadeiro garrote de tributos. Borbulham favelas por todos os lados e as bacias hidrográficas são transformadas em verdadeiros valões de esgoto diante de um poder público míope, dominado por uma classe política que já há quatrocentos anos perdeu qualquer pingo de vergonha na cara, salvo raríssimas e isoladíssimas exceções. O passivo ambiental gerado pela apatia, indolência, incompetência e certeza da impunidade da classe política em nossa colônia, já deixou de ser apenas um problema para a Natureza, metamorfoseando-se num gigantesco monstro que gera problemas de ordem de saúde pública e econômica para a Cidade do Rio de Janeiro. Olho para o cartaz que diz: “Sorria você está na Barra”, penso: “Só pode ser gozação”. Olho para baixo e vejo o esgoto, gigogas, algas tóxicas e lixo, muito lixo, fluindo em direção ao mar, a latrina final, onde alguns “pescam” e outros mergulham. Vem uma certeza de que estamos percorrendo, tanto “localmente como globalmente”, o mesmo caminho que conduziu ao colapso, inúmeras sociedades primitivas, que não dispunham dos instrumentos tecnológicos, atualmente à nosso alcance, que mostram claramente a insustentabilidade do modelo de relação parasitária da sociedade humana para com o meio ambiente. Lembro da nossa cultura colonial do pau-brasil, do “usar até acabar”, onde continuamos trocando até hoje, nossa megadiversidade economicamente riquíssima, por nossas míopes e imediatistas monoculturas exportadoras, seja na Amazônia, na Mata Atlântica, no Cerrado como nos demais biomas. Sinto um gosto amargo na boca. Volto a olhar para as gigogas escoando pelo quebra-mar e para um bando de urubus caminhando pela praia. Sinto no ar o cheiro de podre, o mesmo cheiro que sinto na Baía de Guanabara e na Baía de Sepetiba, onde o dique da Ingá continua em sua contagem regressiva para o maior desastre ambiental costeiro brasileiro e chego a conclusão que precisamos em 2006 fazer uma faxina radical em nossa classe política. Independente de nossa ação, a Natureza mais uma vez deu seu recado com a invasão das gigogas e das algas tóxicas: “Eu não me protejo, eu me vingo”. | ||
Mario Moscatelli - Biólogo - moscatelli@biologo.com.br |
A opinião dos colunistas é de inteira responsabilidade dos mesmos