.Planeta Oceano Agenor Cunha da Silva

Planejamento Integrado e a ocupação das áreas costeiras

Este artigo volta-se para questões que envolvem a ocupação da zona costeira no Litoral Brasileiro. Em uma primeira aproximação é possível verificar através de uma simples inspeção que a evolução dos processos de ocupação antrópica difere de forma bastante relevante ao longo da nossa costa. É patente que os municípios passem a adotar em relação às formas de ocupação políticas publicas mais expressivas adotando Planejamentos Integrados. Devem estar, voltadas para a preservação ambiental, onde a preservação dos recursos marinhos passe a ter significado mais amplo considerados como legado para as futuras gerações.

Nestes termos, as necessidades e ajustes nos processos de ocupação antrópica fica patente quando verificamos a grande diversidade cultural expressa pelas diferenças econômicas e sociais expressas pelas variações de densidade como reflexo das ações políticas. Nos mapas se observam longos trechos com baixas densidades demográficas em contraposição a partes do litoral que afogadas pelo crescimento desordenado dos núcleos urbanos que apresentam altos índices de densidade populacional. Tais situações, via-de-regra, provocam desequilíbrios e tensões sociais por vezes incontroláveis, resultando em degradação da qualidade de vida e exaustão dos recursos marinhos.

Os problemas ambientais que vem acontecendo nas áreas costeiras já estão sendo motivo de preocupação para as autoridades em todo o país, principalmente nos municípios litorâneos.

Diversas ações, decorrentes de programas de desenvolvimento e de projetos voltados para a área costeira vem sendo aplicados.

Neste sentido algumas instituições como o Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente e Desenvolvimento da Universidade Federal do Paraná vem adotando políticas voltadas para o Desenvolvimento Sustentável com resultados satisfatórios.

Ao meu ver, como passo inicial é importante definir alguns conceitos relativos às definições a serem adotadas, bem como a divulgação dos conceitos já consagrados na literatura pertinente. Neste sentido, cabe destacar o conceito do "desenvolvimento que atende as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de satisfazer as necessidades das futuras gerações". A economia sustentável necessita de adaptações e melhorias contínuas voltadas para a preservação do ambiente (ISO14000). Em essência, o desenvolvimento sustentável é um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às necessidades e aspirações humanas "(CMMAD/ONU, 1988, p. 46). O capítulo 2 da Agenda 21 (1995, p. 14) apregoa que" a experiência demonstrou que o desenvolvimento sustentável exige comprometimento com políticas econômicas saudáveis e um gerenciamento igualmente saudável. Uma administração eficaz e previsível; integração das preocupações ambientais ao processo de tomada de decisões; e avanço para um Governo democrático, à luz das situações específicas dos países, com a plena participação de todos os grupos envolvidos."".

Com isto, é possível concluir que o desenvolvimento sustentável é mais amplo e congrega processos que convergem para o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico, ecológico e social. Todo plano de ação deve voltar-se para a busca do equilíbrio dentro de uma visão geosistêmica, onde se considera o ambiente costeiro acima de tudo como um sistema aberto que inclui, em uma certa área, todos os fatores físicos e biológicos do ambiente e suas interações, resultando numa atividade de alta sinergia entre os fatores bióticos e a troca de energias dentro do próprio sistema.
Neste contexto, na ocupação da zona costeira, alguns estudiosos demonstraram a grande importância do desenvolvimento no que concerne à presença da energia elétrica e suas relações com aspectos de conforto e modernidade nas pequenas comunidades. É interessante abordar o estudo de caso na Ilha do Mel-Pr, efetuado em 1999 por Frederico Reichmann Neto em sua tese de Doutorado para a UFPR, onde tais conceitos são definidos conforme resumo abaixo:

" Considerando-se a energia elétrica como um fator de indução do aquecimento da atividade turística, neste trabalho procurou-se identificar as transformações sócio-econômicas e ambientais ocorridas com as disponibilização da eletricidade em larga escala nas comunidades da Ilha do Mel. Para tanto, desenvolveu-se um modelo de análise, correlacionando-se o crescimento do consumo de energia e o número de consumidores com alguns indicadores de conforto e modernidade, tomados no âmbito do domicílio dos moradores locais. Concluiu-se que a energia elétrica contribuiu decisivamente para que a sociedade ilhéu assimilasse novos referenciais de conforto e modernidade, contudo, em contra partida, o morador nativo cedeu gradualmente seu espaço econômico e social para o morador migrante e para o veranista".

Outro estudo, igualmente importante no que concerne à ocupação antrópica na Zona Costeira foi aquele também desenvolvido em 1999 na tese de doutoramento desenvolvida por Maria Esmeralda Santos de Moraes que aborda aspectos sobre a Dinâmica espacial da ocupação antrópica na restinga do perímetro urbano de Paranaguá-PR. Segundo a autora, os estudos realizados permitiram validar as hipóteses propostas, podendo-se afirmar que:

O processo histórico e as dinâmicas sócio-econômicas resultaram no avanço da fronteira urbana sobre a área do ecossistema em estudo, devido à proximidade das atividades produtivas, a abertura de loteamentos em áreas pouco valorizadas e ao acesso às parias;
Esse processo de ocupação antrópica ocorrido e as tendências de apropriação dos recursos naturais contribuíram significativamente para a transformação e desaparecimento deste ecossistema, gerando situações diferenciadas de impactos ambientais;
A legislação ambiental revelou-se inadequada, no sentido de minimizar as ações impactantes sobre a restinga da área estudada, principalmente no que diz respeito à sua proteção, uso e ocupação. Através do estudo interdisciplinar, obteve-se uma visão diferenciada da interface natureza/sociedade, proporcionado para a área em questão a compreensão do espaço atual, as tendências da ocupação antrópica, em função das dinâmicas sócio-econômicas ocorridas ao longo de sua história, bem como os impactos decorrentes desta dinâmica sobre a restinga e para a população local.

Ainda, segundo LEAL, C. T. - Pós-Graduação em Solos/ UFPR e BIONDI, D. - DECIF/UFPR, a região litorânea do Paraná apresenta identidade fisiográfica, paisagística, histórica, cultural e arqueológica. A interdependência dos seus ecossistemas continentais, costeiros e marinhos, de inestimável valor e relevante importância ambiental, em face de sua elevada produtividade biológica e excepcional estado de preservação, requer um gerenciamento que leve em consideração estes múltiplos componentes da paisagem costeira. O autor afirma ainda que a região litorânea do Paraná apresenta identidade fisiográfica, paisagística, histórica, cultural e arqueológica. A interdependência dos seus ecossistemas continentais, costeiros e marinhos, de inestimável valor e relevante importância ambiental, em face de sua elevada produtividade biológica e excepcional estado de preservação, requer um gerenciamento que leve em consideração estes múltiplos componentes da paisagem costeira. A região abriga atualmente os últimos remanescentes da cobertura vegetal original do Estado e também grande percentagem da avifauna e da mastofauna paranaenses.

Essa enorme base de recursos naturais da Região coloca-a sob uma permanente pressão econômica, quase sempre de caráter especulativo e faz com que o interesse sobre a mesma transcenda em muito o âmbito local. O crescimento de sua malha urbana tem sido acelerado ocasionando a supressão de grandes porções da floresta Atlântica. Visando o planejamento do uso e ocupação do solo nas áreas urbanizadas e urbanizáveis e a proteção ambiental, será feito um estudo desta paisagem através do cruzamento de informações geomorfológicas, pedológicas, climáticas, vegetação, recursos hídricos e ocupação urbana. Com isto, irá se criar condições de avaliação da qualidade ambiental adequada aos conceitos de turismo e lazer. Através da caracterização fisiográfica e ocupação antrópica, pretende-se construir um ambiente de sistema de informações geográfica - SIG, que permita automatizar as análises espaciais relacionadas com a paisagem urbana litorânea, buscando um instrumento para identificar, quantificar e qualificar a qualidade ambiental através de parâmetros preestabelecidos. O sistema permitirá atualizações e avaliações periódicas da intervenção antrópica no ambiente natural e servirá de subsídio ao planejamento urbano e regional. O estudo da paisagem no litoral paranaense poderá servir, também, como um instrumento eficaz no processo de conscientização da importância da preservação destes últimos remanescentes de cobertura vegetal do estado do Paraná como fonte de equilíbrio psico-bio-físico do ser humano.

Assim, dentro deste contexto, cabe colocar alguns conceitos que ao meu ver se constituem fundamentais necessários à formulação para que possamos passar a formular nossas reais pretensões em relação à Zona Costeira. Dentre eles se destacam os seguintes:
a) Os recursos renováveis e não-renováveis e a zona costeira como recurso em si
Apesar do nome, os recursos naturais não-renováveis também se regeneram naturalmente. A diferença com os renováveis é que a escala de tempo para a sua renovação é muito maior do que a escala com que os seres humanos lidam. Os recursos não-renováveis são basicamente os recursos minerais, e os renováveis, os biológicos. Hoje, há uma tendência em aplicar o conceito de recurso natural a toda a zona costeira em si, não só os seus recursos biológicos e minerais. Usa-se, por exemplo, também para lazer e recreação.
b) Exploração e explotação
O termo exploração, em geologia, relaciona-se à fase de prospecção: busca e reconhecimento da ocorrência dos recursos naturais, e estudos para determinar se os depósitos têm valor econômico. A explotação é a retirada do recurso com máquinas adequadas, para fins de beneficiamento, transformação e utilização. Portanto, o maior impacto no meio ambiente é causado pela explotação.
c) Processos costeiros
A erosão e a sedimentação costeiras e a variação da linha da costa causada por elas são fenômenos naturais. No centro, sudeste e sul do litoral brasileiro, a erosão é causada principalmente pela ação das frentes frias, que modificam o comportamento do mar, tanto da agitação marítima quanto no seu nível. No norte e nordeste, os principais fatores são os ventos, que modificam o clima das ondas. Entretanto, quando há ocupação humana nas áreas costeiras de variabilidade natural, podem aparecer problemas sérios.

Na cidade de Matinhos, no litoral do Paraná, a Avenida Beira-Mar foi construída sobre as dunas da praia. "As dunas são o reservatório de areia das praias", explica Eduardo Marone, coordenador do Laboratório de Processos Costeiros e Estuarinos (PROCEs) da Universidade Federal do Paraná (UFPR). "Quando você asfalta as dunas - a reserva de areia que evita que a praia seja erodida - desaparece a fonte de manutenção da linha de praia".O resultado disso é que a cidade é quase anualmente atingida por grandes marés ("ressacas"), que já chegaram a destruir parte da Avenida Beira-Mar e algumas construções próximas.

Após uma dessas ressacas, há mais de 15 anos, foram instalados na praia os chamados "gabiões", ou seja, foram depositadas pedras ao longo de um setor da praia, presas com uma grade. Isso aumenta o processo de deposição, e a praia começou a se reconstituir. Porém, segundo Marone, a solução através de estruturas duras como essas é apenas paliativa. Primeiro, porque hoje o arame que prende as pedras já está gasto e rompendo-se, transformando-se num perigo para os banhistas, além de ser esteticamente pouco agradável. Segundo, porque, quando se bloqueia a ação do depósito ou erosão em um local, o mar vai agir em outro. "A natureza tem que tirar e pôr sedimentos o tempo todo, esse é o estado natural dela", diz o pesquisador. "Quando impedimos que em algum local o ciclo de retirada e transposição de sedimentos desapareça, você pode até resolver o problema desse local, mas o mar vai ter que agir em outro lugar que não está protegido".Por isso, a solução mais recomendada para o problema da erosão costeira é a reavaliação da ocupação do solo. Dependendo do custo, pode-se realocar comunidades litorâneas. "A Espanha", diz Marone, "é o país mais avançado nesse sentido: simplesmente desapropriou as obras marítimas nos locais onde havia problema de erosão e reconstruiu o ambiente natural".Em outros casos, como em cidades, não é possível fazer a realocação. Nesses casos, a segunda técnica mais recomendada é a manutenção da orla de praia por meio de deposição artificial. É usada, por exemplo, no litoral da Califórnia: os restaurantes, hotéis etc. pagam uma draga que está todo o ano circulando e "engordando" as praias.

d) Critérios para delimitação do mar territorial brasileiro podem ser alterados
A Câmara dos Deputados promoveu, no final do ano passado, audiência pública para discutir os critérios para a demarcação da divisa entre estados e municípios costeiros e para a compensação financeira pela exploração de recursos naturais no mar territorial. A matéria é tratada no Projeto de Lei 4359/01, do deputado Feu Rosa (PSDB-ES), estabelecendo que a demarcação da divisa entre estados e municípios costeiros será feita com base nos pontos relativos ao limite interestadual e intermunicipal na linha da costa e seu correspondente na linha do mar territorial.O projeto também estabelece que a participação na exploração dos recursos naturais em mar territorial, plataforma continental ou zona econômica exclusiva deve ser dividida em partes iguais entre os estados e municípios limítrofes. O problema, na opinião do deputado Gustavo Fruet (PMDB-PR), é que a proposta não avança no sentido de uma definição clara, deixando a decisão para o poder executivo como já acontece hoje.

A legislação atual não fixa critérios específicos, apenas determina que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estabeleça as linhas de projeção dos limites territoriais confrontantes, segundo a linha geodésica ortogonal (perpendicular) à costa ou segundo paralelo até o ponto de sua interseção com os limites da plataforma continental. "É um assunto complexo, que precisa ser discutido a fundo", diz Fruet. Ele cita como exemplo a ação que tramita há 11 anos no Supremo Tribunal Federal (STF), discutindo as divisas marítimas entre Paraná e Santa Catarina. A ação foi proposta pelo Governo de Santa Catarina para reivindicar os royalties pela extração de petróleo em poços hoje considerados em território paranaense. O estado de Santa Catarina reivindica participação nas receitas recebidas pelo Paraná pela exploração do poço P-14 da Petrobrás, no campo de Caravela. O perito designado pelo STF, José Jaime Rodrigues Branco, contestou os critérios adotados pelo IBGE e estabeleceu uma nova divisão que reduz substancialmente o mar territorial do estado do Paraná.

O Supremo ainda não tomou uma decisão, mas, se seguir o parecer do perito, além de ter de devolver ao estado de Santa Catarina algo em torno de US$ 20 milhões por ano de exploração, o Paraná terá enormes perdas em sua arrecadação. É que a decisão pode criar jurisprudência e estabelecer novos critérios para a demarcação. Só para se ter uma idéia das receitas que deixará de arrecadar, basta dizer que a Petrobrás deverá dar início em breve à exploração de três novos campos - Coral, Estrela e Tubarão. Só o primeiro tem uma estimativa de produção duas vezes superior à de Caravela. "Estamos falando, por baixo, em US$ 50 milhões", calcula o deputado federal Gustavo Fruet. Pela legislação vigente, há mudança de traçado cada vez que se amplia a extensão da zona econômica exclusiva. O deputado explica que apenas os estados do Paraná e do Piauí não têm linhas de projeção paralelas de seu território, em razão da configuração côncava de seu litoral.

"Esse tema tende a ganhar maior visibilidade à medida que forem confirmadas novas descobertas de poços de exploração de petróleo. O assunto é estratégico para o país, para os estados e municípios", afirma Fruet.

MSC. Agenor Cunha da Silva - agenor@biologo.com.br
USU/ICBA - RJ

imprimir
imprimir a página
artigo anterior

.

| ongs | universidades | página inicial

A opinião dos colunistas é de inteira responsabilidade dos mesmos